terça-feira, 3 de maio de 2016

O ventre de Jocasta

O ventre de Jocasta

à Isabel Cristina Rodrigues
É só teu esse festim que no coração adubas.
*
O amor é a lâmina e a lâmina o cântico
e perfumando a lâmina o coração em sangue
algures entre a desagregação do húmus,
*
ou seria somente
a carne o coração da morte que flutua,
corpos do tempo pretérito
de inocentes labirintos,
quando os voos eternos são de púrpura
quando esta dolência me fascina
quando não existe mais nada
e eu pernoito vicioso musgo em ti,
vivo no instante de sonhar
na boca cozida de um deus desconhecido?
*
O mundo cegando cego de fome de ter sol
e o coração é uma utopia áspera, líquida.
*
E quando no coração te alagas
que freixos são os teus
em ave afoita
se o coração no chão da teia não te fecunda?
*
Mastigas pois teus próprios espinhos
já que teu cego coração engoliu a própria rosa.
Dezembro de 2013


João Rasteiro (Portugal)
Poeta e ensaísta. É Licenciado em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Universidade de Coimbra. Possui poemas publicados em várias revistas e antologias em Portugal, Brasil, Moçambique, Itália, Espanha, Finlândia, República Checa, Colômbia, México e Chile. Obteve vários prémios, nomeadamente a «Segnalazione di Merito» do «Concurso Internacional Publio Virgilio Marone» e o «Prémio Literário Manuel António Pina». Em 2012 foi um dos 20 finalistas (poesia) do «Prémio Portugal Telecom de Literatura». Publicou os livros: A Respiração das Vértebras (2001), No Centro do Arco (2003), Os Cílios Maternos (2005), O Búzio de Istambul ( 2008), Pedro e Inês ou As madrugadas esculpidas (2009), Diacrítico (2010), A Divina Pestilência (2011), Tríptico da Súplica (Brasil, 2011), Elegias (2011), e Pequena Antologia da Encenação – 2001/2013: Poemas em ponto de osso (2014). Em 2009, organizou para a revista Arquitrave da Colômbia, a antologia, intitulada «A Poesia Portuguesa Hoje».

(Publicado em Elipse 4)

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